quinta-feira, abril 17, 2008

Regresso - 41


Ricardo estava calmo, tinha os movimentos calculados. Nada iria falhar, tinha que se desvincular daquele objecto e principalmente da sua dona. Abriu a gaveta mais próxima do chão e procurou entre os seus pijamas e os da sua mulher a peça de roupa que mais o tinha feito suspirar. Pegou nele, azul suave, inocente e ingénuo à primeira vista, mas tão sexy ao toque e tão indecentemente lascivo. Passou largos minutos a embrulhá-lo em papel reciclado, bege morto que em tudo contrastava com o poder do pijaminha. Escreveu algumas palavras numa letra desenhada com cuidado, não queria ser reconhecido.
Saiu de casa, consciente que Letícia estaria no trabalho àquela hora, tocou à campainha e pediu à Dona Isabel para poder deixar o embrulho à porta da inquilina. Ricardo subiu as escadas e pousou cautelosamente o embrulho na soleira da porta de madeira. O bilhete ligeiramente aberto:

"Devolvo-te a pele que te falta, perdoa-me o desejo incontrolável que me fez levá-la para longe de ti."

quarta-feira, abril 16, 2008

Entrou de mansinho na casa adormecida. O aroma a refogado passava já da porta e não se espantou por encontra-la aberta. Melhor, pensou, menos esse constrangimento.
Ninguém a esperava ou surgira para a receber. A comida, a apurar em lume brando, acelerava as paixões que fervilhavam em ambas as divisões. A mesa estava posta para dois, o vinho verde gelado suava ao calor que as velas vermelhas emanavam ao seu lado. Olhou-se no espelho e sorriu de satisfação. Era uma mulher bonita. Ao som da música que tocava baixinho descreveu movimentos sensuais com o corpo ondulante, como quem faz amor consigo mesmo. Sentia-se bem. Sentou-se na cadeira que lhe estava destinada, e aguardou.

Chegaste pouco depois, de barba por fazer [sabes bem, Miguel] e camisa meio aberta, deixando a descoberto o peito que o teu coração fez crescer. Trazias uns calções de Verão, revi-te na esplanada comigo, tardes de verão e marisco, eu a rir e cascas no meu cabelo. Tu rias também, tiravas-mas e roçavas a mão suja pelo meu rosto. Riamos os dois, idiotas apaixonados, ou assim queríamos crer...

Sentados à mesa, o vinho levou o embaraço, trouxe o riso solto e sincero. O cabelo ondulado dela brilhava mais com ele por perto, e não podia deixar de o tocar, de se tocar quando ele era a pessoa que lhe devolvia o sorriso para lá da mesa.
Aos poucos, poucos mais de dois centímetros, um, nenhum intermediavam aqueles dois. Os seus lábios carnudos tocavam o pescoço dela e a sua barba de três dias [bem sei que é assim que gostas] chamavam arrepios que ela tentava esconder. As mãos dela tocavam-lhe as coxas, apertavam-nas ao ritmo dos beijos dele que lhe desciam agora pelo decote.
O comer arrefecia nos pratos, o vinho há muito que acabara e a roupa de Letícia aproximava-se perigosamente do chão da sala. Já no sofá, arfavam os dois, amantes inconfessáveis e eternos [como me livro de ti, Miguel? Faz-me não gostar de cada beijo, conseguir não caber no teu abraço…] mas ela mascarava bem as dúvidas que lhe assolavam o coração e tomou a dianteira. Trepou-lhe o corpo moreno e delineado e beijando-lhe o peito fez descer a camisa até ao chão. Agilmente escorregou a mão em direcção ao pecado e com um só movimento desapertou-lhe o cinto e o botão dos calções. Visivelmente inebriado, Miguel tenta alimentar o desejo daquela fogosa mulher. Inverte a situação saltando-lhe para cima e arrancando-lhe a blusa que escondia os mais bonitos e reais seios em que já tocara. Ela, arrepiada, fazia-o subir e descer ao ritmo da sua respiração ofegante de prazer. Suada ficava mais bela, [és tão linda, não tens noção…] faces ruborizadas com a mão dele entre as suas pernas, não se inibia de soltar um gemido. Despidos de roupa, medos, memórias de um passado recente em desilusão e saudade, tremiam em síncope de misto de dor e prazer entorpecidos pelo calor que provocavam juntos. Ela, de novo por cima, balançava as suas ancas para a frente e para trás, num movimento febril e compassado, e pegando nas mãos deles pousa-as sobre o seu peito. O seu coração batia veloz, à medida que ela aumentava o ritmo, acelerava o passo. E balançava, portentosa, dona de si, mulher de paixões, à medida que os dedos de Miguel lhe vincavam a cintura, cerrados pelo tamanho deleite.
Assim se mantiveram, escravos do prazer até que o corpo humano cedeu, até que Miguel se deu. E deitados, esgotados, foram reacendendo uma paixão difícil de controlar, nas cinco vezes seguintes que, naquela mesma noite, se tornaram, fisicamente, um só…

terça-feira, abril 15, 2008

Era ela - 39

Chegara mais um fim de tarde, mais um pôr-do-sol se aproximava. Quase sem hesitar ligara-lhe:

- Estou, Miguel?

- Olá...

A voz falhou-lhe ao perceber que era mesmo ela. Assustava-o a forma como a sua mente se prendera àquela morena de corpo esguio.

- Tudo bem? Hoje sonhei contigo...

Assim. Quase fria, quase atrevida. Sem meias-medidas. Surpreendeu-se com o seu próprio à-vontade.

- Ah foi? E foi um sonho bom?

- Hum...foi óptimo, eu diria, para o teor quente que tinha...

Ele sorriu silencioso do outro lado.

- Conta-mo!

- Nah! Quero realizá-lo...

Era esta audácia que o apaixonava.

- Parece-me boa ideia!

- Que tal esta noite?

- Ah! Não posso, tenho um jantar de amigos...

- Perfeito!

Ele ficou desorientado.

- Ãnh? Mas...não posso!

- A que horas sais de casa?

- Lá p'rás 20h30...

- Óptimo, lá estarei!

- O quê?! Letícia...!

Mas ela já tinha desligado. Ele pousou, atónito, o telemóvel e sacudiu a cabeça incrédulo.
Do outro lado ela sorria, num misto de espanto e satisfação. Só queria saber se teria coragem para ir até ao fim...

segunda-feira, abril 14, 2008

Sonho - 38

Chegou a casa cansada, depois de uma noite acalorada entre lençóis ia ser bom descansar. Entrou discretamente, não percebeu porquê mas queria evitar que o Miguel a visse...Deixou cair as chaves no móvel da entrada e proseguiu largando o casaco e a mala num dos cadeirões. Estendeu-se no sofá e aninhou-se, alcançou o comando da aparelhagem e ligou-a. Deixou a música preencher o espaço e sem pensar em nada adormeceu.

De repente estava numa casa diferente de todas as que conhecia, num quarto escuro em tons vermelhos. Sentada na cama, envergava uma lingerie escura com pormenores inocentes mas extremamente sexy's. Ouviu o trinco da porta e sentiu-se sorrir, Miguel entrava distraído, de toalha à cintura, ainda quente e molhado do banho. Espantou-se ao perceber que não estava sozinho, sorriu mas esforçou-se por não perder a pose, disse:
- Olá, estás muito bonita...mas agora não posso, vou sair. Fica para outro dia...
Letícia sentiu os seus olhos faiscarem, levantou-se e a sorrir lascivamente empurrou-o para cima da cama. Abanou a cabeça e prometeu-lhe que ele não sairia dali antes de a satisfazer. Miguel tentou ser forte e negar, mas a sua excitação já era evidente através da toalha branca, na verdade só a visão da sua vizinha naquele conjunto tão sensual já tinha feito estragos. Ela beijou-o de forma ingénua e calma, desceu pelo seu pescoço, mordendo suavemente o seu ombro...passeou a língua pelo seu peito e agarrou a toalha com os dentes, abriu-a e sorriu provocadoramente enquanto o apreciava.
Ele respirava com dificuldade e agarrava a colcha na cama para manter o controlo, Letícia levou-o ao extremo, ao limiar do abismo vezes sem conta...até que ele a travou. Sentou-se e obrigou-a a tombar sobre a cama também, desta vez foi ele quem se divertiu na pele dela. Ela sorria, satisfeita e poderosa, consciente que teria deixado outra rapariga qualquer à espera daquele homem que não ia chegar tão cedo.
Depois de lhe ter arrancado a lingerie Miguel soube explorar cada centímetro, levou-a a contorcer-se descontroladamente duas vezes e quando já se sentia louco de desejo, penetrou-a suavemente sentindo-a como sua. Letícia entregou-se ao prazer mais uma vez e de unhas cravadas no ombro do Miguel não conseguiu calar um gemido que o fez perder o chão...


Letícia acordou afogueada com um feixe fraco de sol a iluminar-lhe o rosto. Sorriu espantada e percebeu que ainda envergava o vestido vermelho. Levantou-se e foi tomar banho para depois preparar o jantar. «Sábado ocioso» pensou.

Só mais um - 37

Fora um encontro como outro qualquer.
Um rosto conhecido, bonito, com a barba de três dias, que ela tanto gostava.
Um corpo musculado, suado pelo desejo, jazia agora em arfado cansaço, depois do melhor sexo da sua vida com alguém que já tivera melhor.
Tenho de parar de fazer sexo porque sim..., pensava Letícia. Hoje tivera de pensar onde estava ao acordar e detestou a sensação. Os lençois não eram seus, nem tinham sido lavados por si. A vista não era aquela a que se habituara a cada manhã e neste apartamento não estava sozinha.
Não querendo melindrar aquele cujo rosto ainda marcava um sorriso pateta típico de miúdo bonito que sai poucas vezes, Letícia vestiu silenciosamente a lingerie que comprara no dia anterior, e num movimento rápido e pragmático enfiou o vestido vermelho que tanto pecado gerara. Tenho de o usar mais vezes, pensou, sorrindo.
Agora, Miguel.
Bem, amanhã penso nisso.

Magia - 36

Podia parecer incrível, mas a verdade é que não o via fazia tempo que nem ela sabia já contar. Moravam no mesmo prédio, seria possível que estivessem assim tão destinados a não se encontrar? Estava cansada de sentir que o chão lhe fugia quando horas corriam e não deixava de pensar nele. Habituara-se à sua permanência e parecia custar menos tê-lo sem o ter na realidade, a não ter ninguém que a enchesse de memórias e arrepios passados.
Envolta em pensamentos passou a caixa do correio, entreaberta, sem sequer se interrogar o que seria aquele bilhete pequeno, amachucado, qual recado de criança em plena escola primária. Envolta em pensamentos mantivera o telemóvel em modo silencioso, negligenciado a sua mensagem que aguardava uma resposta que ficara muda.
Do outro lado ele roía as unhas, passava as mãos pelo cabelo, em jeito de ansiedade. Porque não me respondes Letícia...?, questionava-se, irrequieto.
Chegaram as oito. No bilhete, ainda bem dobrado dentro de uma caixa de correio esquecida, estava combinado o encontro ao qual Letícia se preparava para faltar, sem saber.
Miguel entrou no prédio e mesmo sem mudar de roupa dirigiu-se a um apartamento que não era seu.
Pousou, leve, a sua pesada mão sobre a porta. Sossegada estava a casa que muito já vira sem que pudesse contar. Encostou o rosto quente de temor à porta que guardava a mulher que mais o fizera suspirar, por mais silencioso que batesse o seu coração.
Nisto a porta abre-se e Miguel quase cai no seu decote. Letícia ali estava, pronta para alguém que não era ele, com um tom de pele quente e bronzeado e um vestido vermelho vivo que mal o deixava respirar.
-Podemos falar?, soltou
-Agora? Miguel, tenho um compromisso.
-Sim, é comigo!
-Não, não é contigo, mas que raio, apareces aqui sem avisar, e partes do pressuposto que temos um compromisso? 'Tas doido?
-Ammm mas... eu deixei-te uma mensagem, tu não respondeste.
-Ah, hum... uma mensagem?, pergunta num misto de espanto, embaraço e uma alegria inconfessável. Mas não. Hoje não ia vacilar.
-Bem, vai ter de ficar para outro dia, agora já estou atrasada.
E fechou a porta a três centímetros do seu rosto de homem de ego ferido e olhos de cachorro abandonado.

domingo, abril 13, 2008

Backseat - 35

Ele ainda lembra uma das noites em que saíram juntos.

Ao chegarem a casa ele impediu-a de sair do carro, aproximou-se cuidadosamente dos seus lábios e beijou-a. Rapidamente a fez passar para o banco de trás e entre beijos e carícias Miguel soube perder-se numa pele que não era a sua.
Letícia deixou-se levar sem cordas que lhe amarrassem a alma e o desejo.
Os beijos sôfregos a deixar os lábios dormentes e a pedir por mais, as mãos de Miguel quentes, provocadoras - que lhe ofereciam arrepios pelo corpo todo. A sua respiração ofegante e entrecortada no ouvido dele, estímulo ao qual ele não era capaz de resistir.
Apertada entre uns braços calorosos sentia-se confortável, desejada. A sua pele escaldava, limite suave de um desejo quase incontrolável. As mãos dele, ariscas, atrevidas a procurarem a pele nua, a percorrerem-lhe as costas com astúcia e a deixar Letícia rendida a todas as sensações.
"Loucos" repetia ela ao ouvido de Miguel enquanto sentia cada vez mais necessidade do corpo dele. As peles misturadas, as mãos unidas. As bocas entrelaçadas em beijos infinitos.
Letícia prendeu-lhe as mãos paralelas à cabeça, impedindo o seu toque irresistível e provocando-o, doce tortura acompanhada da sua língua lasciva a percorrer-lhe a pele do pescoço. A cada investida ela sentia-o apertar-lhe os dedos num pico de prazer e a cada arquejo ela imergia um pouco mais no mar de desejo que os envolvia....

Um som ensurdecedor arrancou-o das suas memórias, era o telefone a tocar. Seria ela?

quinta-feira, abril 10, 2008

Chocolate - 34

Dois meses. E o sabor dele continua na minha boca. Porquê?De vez em quando vem perturbar-me os pensamentos sem razão. Oh vá lá...não tens razão nenhuma para lhe ligares..está mas é quieta! Sim..e se lhe ligasses o que é que lhe dirias?
"Ah olá Miguel, sou eu...'tá tudo bem contigo? ...sim? Comigo também! Pois é porque hoje não me sais da cabeça e eu queria mesmo entrar-te pela casa a dentro e encostar-te a parede com beijos sôfregos e violentos...sim,sim...e arrastar-te para a cama e comer-te como se fosse a última vez!"


Oh por favor...és tão patética. Esquece-o de uma vez por todas....
Já sei! Vou sair..vou ligar à Patrícia e à Marta e convidá-las para sair comigo...vamos à caça! Sim, tenho que encontrar uma distracção!

Se ao menos ele não me deixasse assim, se ao menos eu não ficasse a fantasiar com os beijos e as carícias...se...oh vá lá. Pára com isso!

Chocolate, vou comer chocolate. Ná...tu não estás apaixonada por ele. Vá lá cala-te.Que parva. Chocolate.Chocolate.Chocolate. Só eu e chocolate.